Sabe, Lola, eu procuro me abster de entrar em polêmicas pelas redes sociais, mas, desde ontem ao ver um post de um amigo intelectual, no qual ele fazia questionamentos sobre o falecimento de Eduardo Campos e a espécie de "deificação" de sua figura, como se erros fossem esquecidos após sua morte e depois de ver os comentários suscitados pelo post (afinal o amigo que o publicou é um formador de opinião carismático) não pude me abster de escrever essas linhas.
Segundo o meu querido Pierre Bourdieu, nas sociedades humanas existem mercados de bens simbólicos que são mantidos através da dominação de determinados capitais e indivíduos carismáticos. Nas engrenagens políticas e religiosas isso fica, de certa forma, mais evidente. Ou seja, grupos que detém o poder decisório raramente (praticamente nunca) irão querer perder esse controle para grupos adversários e a partir daí advém as disputas políticas que deságuam nos sistemas eleitorais mundiais. Determinados indivíduos dotados do carisma weberiano (e muito bem explorado pela teoria do Poder Simbólico de Bourdieu) são vistos como líderes de pequenas ou grandes sociedades. Alguns seres humanos, como Nelson Mandela, Martin Luther King Jr., John Kennedy, Mahatma Gandhi, são exemplos de indivíduos dotados desse elemento carismático e que a partir dele conseguiram construir uma mítica em torno de suas públicas figuras e, quando de sua morte foram alçados à categoria de mitos sociais.
O mito, segundo estudiosos como Walter Benjamin, se apropriam da linguagem para construir símbolos metafóricos que trazem em si toda uma carga mística para o devir da sociedade na qual surge e se propaga. Mas, Lola, o que me chama a atenção acerca do objeto principal desse texto, um post no facebook, é a tentativa pequena de reduzir apenas ao Brasil essas construções simbólicas em torno de tragédias e perdas de líderes políticos, sociais ou culturais. Foi assim com a morte de Ulysses Guimarães, Arianos Suassuna, Cazuza, Ayrton Senna... e agora o é com Eduardo Campos... Gostaria apenas de avisar às pessoas que estão nessa corrente que essas construções não são propriedade exclusiva nossa! E, se assim fosse, como o resto do mundo seria vazio de líderes e ícones...
Quem dentre vós não sabe que se construiu um mito em torno de figuras emblemáticas russas, como Lenin e Stalin?!? Ou em torno de figuras norte-americanas como John Kennedy e Martin Luther King Jr.? Ou os mitos em torno de tantas outras figuras mundiais como Gandhi, Elvis Presley, Margareth Thatcher, Ronald Regan, Juan Domingo e Evita Perón, Getúlio Vargas, Che Guevara, Charles Manson, Sadam Hussein, Osama Bin Laden, Dom Helder Camara, Chico Xavier, João Paulo II, Fred Mercury, Tim Maia, Raul Seixas, Michael Jackson, Gabriel García Márques... etc... etc... etc...
Querem dizer para mim que todos estes nomes são isentos de erros?!? Que todos estes indivíduos que tiveram papéis preponderantes em suas áreas de atuação não cometeram erros, não infringiram leis?!? A criação do DOPS por Getúlio Vargas, as perseguições no seu governo, seu alinhamento inicial com Hitler e Mussolini, seu Estado Novo que era uma Ditadura Civil no Brasil... isso isentou a construção mítica em torno de sua figura?!? A resposta é simples: Não! Os casos de pedofilia atribuídos à Michael Jackson impediu que toda uma áurea de sacralidade em torno de sua figura fosse construída pelos seus fãs ( e não fãs)?!? A resposta também é Não! E Thatcher que depois de falecida foi exaltada como modelo de administração estatal?!? Sério?!? E Cazuza?!? Que tratava a mãe como lixo, traficava drogas... depois de morto foi tido como "bandido" ou como "poeta"?!? Então, meus queridos, a limpeza que a morte traz em torno das figuras midiáticas é um reflexo da necessidade humana de construir seus pseudo-heróis... como os antigos gregos construíram seus mitos em torno de figuras "públicas" como Aquiles ou Odisseu... e querem vender pras pessoas que isso é reflexo do "atraso intelectual brasileiro"?!? Façam-me o favor!!
Ao invés de incitar discussões vazias pelas redes sociais, os que se dizem intelectuais, deveriam sim estarem construindo textos sérios e embasados no conhecimento adquirido que suscitassem debates elevados e dinamizadores do conhecimento... reduzir tudo ao micro, como se o Brasil fosse o começo e o fim do mundo só mostra a pequenez de alguns que só conseguem levar suas mentes a pensarem seus próprios umbigos... por favor, façam construções globais de seus tópicos... tragam o macro pro micro mostrando suas especificidades e particularidades e parem de tentar ser grande entre meia dúzia de "seguidores" anencéfalos e acríticos que, infelizmente, verão suas "palavras de sabedoria" como néctar do conhecimento, quando na realidade não o são...
Se querem debate, então que debatamos como adultos e deixemos as coisas infantis de quem não tem sólidos argumentos para as crianças que por qualquer besteira fazem birra!
E, tenhamos sempre em mente, Lola, que independentemente de "mitos", "símbolos" e "regenerações de caráter", devemos sempre ser éticos e respeitar as dores alheias, não porque somos inteligentes, mas, simplesmente, porque somos HUMANOS!
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